fundo

II Jornadas de Direito Criminal da Comarca de Santarém

04 Nov 2022

–       Senhora Ministra da Justiça

–       Senhor Presidente da Câmara Municipal de Ourém (Dr. Luís Miguel Albuquerque)

–       Senhor Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura

–       Senhor Juiz Presidente da Comarca de Santarém

–       Senhor Presidente Emérito do Supremo Tribunal de Justiça

–       Senhoras e Senhores Juízes Conselheiros

–       Senhores Presidentes dos Tribunais da Relação de Coimbra e Évora;

–       Senhoras e Senhores Juízes Desembargadores

–       Senhoras e Senhores Juízes

–       Senhoras e Senhores Magistrados do Ministério Público

–       Senhor Secretário de Estado Adjunto e da Justiça

–       Senhor Diretor Nacional da Polícia Judiciária

–       Senhor Diretor Nacional da Polícia de Segurança Pública

–       Senhores Presidentes dos Conselhos Regionais da Ordem dos Advogados da Madeira, Évora, Coimbra e Porto

–       Vereadores da Câmara Municipal de Ourém

–       Senhor Presidente da Assembleia Municipal de Vila Nova de Ourém e Senhores Vereadores

–       Senhor Representante do Bispo de Leiria-Fátima

–       Demais entidades civis, militares e religiosas

–       Minhas Senhoras e meus Senhores.

 

 

Começo por agradecer ao Senhor Juiz Presidente da Comarca de Santarém o honroso convite que me dirigiu, e que logo aceitei, para participar nesta sessão de abertura das 2ªs Jornadas de Direito Criminal da Comarca de Santarém, subordinadas ao tema “Os 40 Anos do processo-crime do atentado de 12 de maio de 1982 contra o Papa João Paulo II”.

O tema escolhido para estas II Jornadas de Direito Criminal constitui uma boa oportunidade para reviver um dos momentos mais marcantes da nossa história judiciária e também para vincar a necessidade de ser devidamente tratado o património arquivístico dos tribunais portugueses.

Serei breve nesta dupla abordagem.

 

1.

As visitas papais são acontecimentos da máxima importância em países como o nosso em que a população é maioritariamente católica.

Por isso, quando o Papa João Paulo II se deslocou a Portugal para agradecer a Nossa Senhora de Fátima o facto de ter sobrevivido ao atentado de 13 de maio de 1981, em Roma, foi grande a cobertura mediática por parte da televisão pública e dos jornais da época, que não pouparam nos detalhes.

Por exemplo, a primeira página do Diário de Lisboa de 12 de maio de 1982, noticiava em extensa coluna ladeando uma fotografia do Papa:

O Papa João Paulo II chegou ao aeroporto da Portela às 13:30, dirigindo-se, após os cumprimentos protocolares, em cortejo automóvel até à Sé Patriarcal e Igreja de Santo António.

A seguir, cerca das 15:30, o Papa ruma para o Palácio de Belém, onde (…) será recebido pelo Presidente Ramalho Eanes. Duas horas depois, o Santo Padre recebe na Embaixada da Santa Sé em Lisboa o primeiro-           -ministro e outras individualidades oficiais.

A partida para Fátima está prevista para as 19 horas, mas o helicóptero inicialmente previsto poderá ser substituído por outro meio de transporte devido ao mau tempo que continua a fazer-se sentir.

A chegada de João Paulo II ao santuário é assinalada com uma recepção, na capela das aparições.

A notícia terminava da seguinte forma:

No que respeita à segurança, tudo a postos: um efectivo de cerca de 750 homens da PSP (incluindo elementos do corpo de intervenção) está destacado para o policiamento da zona de Fátima. – fim de citação.

 Este dispositivo de segurança, que trabalhou em coordenação com o corpo de segurança do Papa, composto por 30 elementos, viria a revelar-se decisivo na proteção do Sumo Pontífice.

De facto, durante a procissão das velas, o padre espanhol Juan Krohn, armado com um sabre militar, aproximou-se de João Paulo II junto da escadaria que conduz ao altar da Basílica, com a intenção de o ferir de morte.

O corpo de segurança atuou a tempo, manietando-o e detendo-o.

Apresentado ao juiz, o Padre Krohn foi colocado em prisão preventiva.

Na edição de 14 de maio, o mesmo Diário de Lisboa descrevia o perfil do agressor, pela voz do seu correspondente em Madrid, que havia sido colega de estudos do padre Krohn na Faculdade de Direito e na Escola de Jornalismo.

O processo-crime instaurado ao padre espanhol foi seguido com a maior atenção pela comunicação social nacional e estrangeira.

Krohn acabou por ser acusado, em agosto de 1982, pelo Ministério Público, da prática dos crimes de homicídio voluntário qualificado, na forma tentada, e de uso, detenção e porte de arma proibida.

O julgamento, em tribunal coletivo, teve início no dia 20 de outubro de 1982, no Tribunal de Vila Nova de Ourém e, após decisão sobre o incidente de alienação mental , o acórdão foi proferido no dia 2 de maio de 1983, condenando Krohn à pena única de seis anos e seis meses de prisão.

Foi célere a decisão, proferida pelo Tribunal Coletivo e célere foi também a Relação de Coimbra a julgar improcedente o recurso que a defesa apresentara.

Hoje, é com grande alegria que assinalo a presença neste evento do coletivo de juízes que realizou esse julgamento, então presidido pelo Senhor Juiz Conselheiro Políbio Flor, tendo como adjuntos o Senhor Juiz Conselheiro Santos Cabral e o Senhor Juiz Joaquim Soares Rebelo.

Vossas Excelências, Senhores Juízes, honraram a Justiça portuguesa, decidindo com celeridade um processo de enorme projeção mediática e que colocava o desempenho da nossa Justiça sob os olhares das mais altas instâncias nacionais e estrangeiras.

E passo já ao segundo ponto desta curta intervenção.

 

2.

Um processo desta importância não podia ficar anonimamente arrumado nas prateleiras de um arquivo de tribunal.

Quero, por isso, deixar aqui uma palavra de felicitação ao Senhor Juiz Presidente da Comarca de Santarém, Dr. Luís Miguel Caldas, por ter resgatado o processo desse comum destino, conferindo-lhe o relevo histórico e judicial que efetivamente tem e garantindo-lhe um destino compatível com esse mesmo relevo.

Esta sensibilidade para discernir o que é historicamente   relevante constitui um excelente exemplo para todo o trabalho que está por fazer de preservação e divulgação da memória judiciária.

Não sendo muitos os processos judiciais que se equiparam ao que hoje se analisa, em termos de relevância judicial e social, sempre haverá alguns que merecem lugar de destaque e tratamento diferenciado.

Nessas circunstâncias, é fundamental que se faça um esforço para a preservação desse património judiciário, que se guarde a memória histórica desses acontecimentos judiciais.

Não resisto a trazer aqui o exemplo do Tribunal da Relação do Porto, que, ao longo de décadas tem juntado e conservado  inúmeros objetos relacionados com a atividade judicial, desde simples instrumentos usados na prática diária dos tribunais, até aos documentos e processos judiciais com mais impacto social, de que são exemplos os processos de Camilo Castelo Branco e Ana Plácido, do Zé do Telhado e do médico Urbino de Freitas.

Todo esse acervo deu origem à criação do Museu Judiciário do Tribunal da Relação do Porto, que já se tornou uma  referência cultural da cidade e que tem suscitado muito interesse aos visitantes e estudantes de várias academias estrangeiras.

À falta de um Museu Judiciário Nacional (ideia por que me bati, sem sucesso, durante o tempo em que exerci a Presidência da Relação do Porto), é necessário que haja, pelo menos ao nível das Relações e em articulação com os tribunais das suas áreas de competência, um esforço para identificar, selecionar e conservar todo o património judiciário relevante, com a ajuda e colaboração de museólogos e historiadores.

O Supremo Tribunal de Justiça e algumas Relações já prosseguem o trabalho de organização dos seus arquivos e de pesquisa, seleção e tratamento dos objetos, documentos e processos mais interessantes. Mas é preciso fazer mais. É preciso sistematizar e estender esse trabalho aos arquivos de outros territórios judiciais, dentro das possibilidades que os poucos recursos humanos proporcionam.

Deixar a memória do trajeto da justiça ao longo da História do País é uma responsabilidade que não podemos descartar, porque é essa memória que reflete a nossa identidade cultural como povo.

Dizendo os processos judiciais respeito a casos da vida real, a forma como estes se desenvolvem e são julgados, nos diferentes contextos históricos, sociais e políticos em que se apresentam, espelha o modo de pensar, sentir e agir dos portugueses.

Essa responsabilidade de conservar o património judiciário mais relevante cabe a cada uma das gerações de profissionais que operam na área da justiça, num esforço concertado para a preservação, valorização e divulgação da história do poder judiciário, que é também a história da sociedade ao longo dos tempos.

Estas jornadas podem constituir o mote para todo o imenso trabalho arquivístico que se encontra por fazer.

É essa a minha esperança.

 

 

Vila Nova de Ourém, 4 de novembro de 2022

​Henrique Araújo, Presidente do Supremo Tribunal de Justiça

 

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